sábado, 23 de fevereiro de 2019

Parte 1, Capítulo 25 - Jr 14,8 profetiza que Jesus seria o Salvador, vivendo entre os homens?


Jeremias 14, 8 diz “Ó esperança de Israel, e Redentor seu no tempo da angústia, por que serias como um estrangeiro na terra e como o viandante que se retira a passar a noite?”. Uma vez me foi perguntado por um cristão o significado da expressão “Esperança de Israel, o Redentor no tempo de angústia”. Eu respondi: o profeta aqui dirigiu-se ao Todo-Poderoso, como no capítulo 17,13: “Ó Senhor, a Esperança de Israel, todos os que te abandonarem serão envergonhados”. O próprio Deus é o Salvador de Israel no tempo de angústia e não há outro Salvador além Dele. Veja também Oséias capítulo 13, 4: “E não há Salvador além de mim”. Meu interrogador disse, então: “Você deve ter em mente que o profeta, falando sobre este Salvador, diz: “por que serias como um estrangeiro na terra e como o viandante que se retira a passar a noite?” Isso não te parece afirmar que o divino Salvador habitaria como um estranho na terra, como nosso Salvador Jesus realmente fez? Por que então você retira dele sua crença depois que o profeta dá seu testemunho sobre ele?”. Eu respondi a isto: “Vocês cristãos estão acostumados a estabelecer suas objeções à nossa fé e as bases de sua fé em passagens bíblicas destacadas, sem levar em conta a ideia principal e as palavras precedentes e subsequentes do texto. Vocês também não fazem comparações imparciais com as declarações paralelas de outros profetas, pois o seu objetivo não é expor a verdade absoluta, mas confirmar, por meio de sutilezas e raciocínios ilusórios, suas noções preconcebidas!”.

O verdadeiro objetivo de Jeremias pode ser encontrado na leitura das passagens próximas. Jeremias teve uma presciência da fome que estava para acontecer na Terra Santa (veja o começo do capítulo 14), quando ele viu que a severidade da escassez excederia todos os limites, e que a consternação de Jerusalém seria um verdadeiro clamor ao céu. Quando o profeta percebeu que a calamidade seria tão universal que os próprios brutos do campo sofreriam sob seu flagelo, ele registrou as palavras [Jeremias 14, 7]: “Se nossas iniquidades derem testemunho contra nós, ó Senhor, então, trata-nos segundo o teu nome”. Com isso ele declarou que o problema não havia chegado ao nosso povo por acaso, mas como consequência de nossas más ações, porque a fome não prevaleceu em nenhum outro lugar, exceto na terra de Israel. Consequentemente, ele implorou ao Todo-Poderoso para conceder alívio por causa de Seu Santo Nome. Por Sua unidade suprema ser proclamada por nossa nação, é chamado “o Deus de Israel”, enquanto nós somos denominados “Seu povo e o rebanho de seu pasto”. Quando Ele nos castiga, Ele age de acordo com a justiça, uma vez que nossas negligências são numerosas e uma vez que frequentemente nos desviamos em direção à idolatria, à perpetração da violência e à escuta dos falsos profetas. Jeremias, tendo feito assim a confissão de nossos pecados, exclama, por meio de súplica: “Tu esperança de Israel e seu Salvador no tempo de angústia!”. O profeta declara que, embora tenham se apartado de Tuas trajetórias, eles (os israelitas) ainda esperam que Tu (Deus) os salve da aflição presente, e do mesmo modo como Tu, Deus, os livraste em todas as gerações, assim também tem misericórdia de agora do povo de Israel, e não permitir que eles sejam consumidos pela fome. Então o profeta continua: “Por que serás como um estrangeiro e como um viajante que se desviou para passar a noite”. Com isto temos que entender “Tu, Senhor, Te esconderás de nós e não terás compaixão de nós? Parecerá que não foste o Senhor da Terra, mas como se fosses estranho em um país estrangeiro, sem poder nos livrar de adversidades”. De maneira semelhante, disse Moisés (Números 14, 15-16): “E se tu matares todo o povo como um homem, então as nações que ouviram a tua fama dirão: Porque o Senhor não tinha o poder de trazer este povo” etc. Assim ora também o salmista: “Levanta-te! Por que dormes, ó Senhor? Desperta! Não nos abandone para sempre!”. Em outras palavras, “permita que não pareça como se o Senhor estivesse desatento a nossa miséria e a nossa aflição”. De fato, todos os profetas se dirigem ao Todo-Poderoso de uma maneira antropomórfica, a fim de transmitir suas ideias de maneira mais inteligível.

A razão pela qual Jeremias compara o Todo-Poderoso com um estranho é tríplice: 1) Um estrangeiro em outra terra é incapaz de resgatar o oprimido da mão do opressor ou o pobre e o necessitado das mãos do depredador, pois embora estranhos ou viajantes sejam de alto nível, sua autoridade é muito insignificante, quando em uma terra estrangeira, para oferecer assistência aos que os rodeiam. Assim, os sodomitas disseram sobre Ló: “Este homem veio morar aqui como um estranho, e agora ele será um juiz!”. 2) Ainda que um homem estrangeiro torne-se estabelecido em uma terra, ele pode ser incapaz de dar assistência em tempos difíceis, se for privado da necessária influência e presença de espírito. Desconcertado com sua própria segurança, ele está totalmente incapacitado para libertar os outros de seu estado infeliz. 3) O estrangeiro só pode lidar com aqueles que lhe são inferiores em coragem e força, mas quando se depara com uma força superior, ele desiste ou se submete. Por isso, o profeta diz: “Por que serás como um poderoso que não pode salvar?”.
 
No entanto, ao mesmo tempo, para ensinar que tal condição é totalmente incompatível com a natureza divina do Todo-Poderoso, e para mostrar que o Todo-Poderoso é realmente o Deus dos céus e da terra e que ao mesmo tempo habita entre nós, o profeta, por meio do acréscimo “Mas Tu estás entre nós” refuta a imputação de que o Deus de Israel é um estranho e prova que Ele está estabelecido onde nós estamos, e que nós somos os estranhos e não Ele. Temos, portanto, a esperança de que Ele nos salvará. A declaração “Tu estás no meio de nós” está em oposição à pergunta “serás como um homem estrangeiro?”. O profeta sugere que o Todo-Poderoso, longe de ficar perplexo com a velocidade de ocorrências terríveis, se manifesta como um libertador incomparável e onipotente. Da mesma maneira, vemos nas palavras “E estás entre nós” um repúdio à ideia de que “Tu és como um homem forte que não pode livrar”, quando resistido por uma força superior. O profeta agora reconhece: “e nós somos chamados pelo teu nome; não nos desampares”. Tu nos tiraste da terra do Egito com uma mão forte e com um braço estendido!

As próprias palavras do Decálogo conectam a unidade divina com a libertação do Egito, uma vez que é dito: “Eu sou o Senhor teu Deus, que te tirou da terra do Egito”. É um fato notório que a Escritura em vários lugares aponta a condescendência de Deus, que aliou Seu nome com Israel, salvando nossos povo de vários problemas. Veja, por exemplo, Levítico 22, 33: “Quem vos tirou do Egito para ser um Deus”. Quando os súditos do rei Ezequias foram resgatados da mão de Senaqueribe, rei da Assíria, o Todo-Poderoso também foi reconhecido como Deus de Israel. Veja II Reis 19, 20: “Assim diz o Senhor, o Deus de Israel: Visto que tu me pediste a respeito de Senaqueribe, rei da Assíria, eu te ouvi”. A oração aqui aludida foi recebida favoravelmente, porque expressava submissão incondicional ao Todo-poderoso Ser que governa sozinho os destinos de Suas criaturas. Outras menções à fé de Israel na salvação pelo Senhor podem ser obtidas em Deuteronômio 3,24, onde lemos “pois, que Deus há nos céus e na terra, que possa fazer segundo as tuas obras, e segundo os teus grandes feitos?”. Isaías diz (capítulo 45,15): “Verdadeiramente Tu és um Deus invisível, o Deus de Israel e seu Salvador”. Jeremias 3,23 diz: “Em verdade, o Senhor nosso Deus é a salvação de Israel; nossa confiança, pois nossa confiança está em Ti”. Assim entendemos a citação de Jeremias que foi colocada no cabeçalho deste capítulo, e que é totalmente mal aplicada pelos cristãos, apenas por mencionar “um estranho na terra”.

Nenhum comentário:

Postar um comentário